Não existe uma tradução específica e determinada para “self”, mas existem palavras que conduzem naturalmente ao papel que um self pode ter (Strawson, 2005). Self incluiria “um corpo físico, processos de pensamento e uma experiência consciente de que alguém é único e se diferencia dos outros, o que envolve a representação mental de experiências pessoais” (Gazzaniga & Heatherton, 2003).
Há muitas definições para self e certamente tal variedade se dá em função de bases epistemológicas distintas nas quais o conceito foi desenvolvido. Pode-se dizer que o termo é algo em construção e novos elementos podem ser acrescentados ou subtraídos em sua definição.
Se pensarmos que self significa um alargamento do conceito de “eu” ou “ego”, necessariamente teremos de incluir processos inconscientes, impulsos, pulsões, instintos e tudo aquilo que compõe a “psique”.
Quando Allport fala em uma primeira característica de pessoas saudáveis a qual incluiria uma “extensão do senso de self”, conforme Feist, Feist & Roberts (2015), este se refere a uma característica de pessoas maduras que “procuram se identificar com eventos externos e deles participar”. Seriam pessoas “não autocentradas, mas capazes de se envolver em problemas e atividades que não estão focadas nela. Eles desenvolvem um interesse altruísta pelo trabalho, pelo esporte e pela recreação”. Nesse sentido, pode-se entender a perspectiva de Allport como uma visão da pessoa madura como alguém que pode se envolver no interesse de outros, não estando restrita aos interesses individuais.
Uma segunda característica de pessoas maduras e saudáveis, conforme Allport, seria marcada por “uma relação cordial do self com os outros”. Tal característica seria decorrência da primeira e se manifestaria por uma capacidade de amar os outros de forma compassiva, de modo não possessivo e desinteressado.
Tais pessoas manteriam relações de respeito, percebendo que as necessidades, desejos e esperanças dos outros não são completamente estranhos às próprias. Teriam ainda uma atitude sexual sadia, não explorando o outro.
Expressariam ainda, como terceira característica, “segurança emocional e autoaceitação”.
Tais pessoas saudáveis entenderiam que frustrações e pequenas contrariedades fariam parte do dia a dia. Algumas vezes as coisas não ocorrem como o esperado e seria um comportamento maduro e saudável reconhecer o fato. Ao contrário, pessoas inseguras tendem a acreditar que um fracasso ou decepção se insere em uma longa relação de decepções e que as coisas nunca dão certo para elas. Outro aspecto relacionado seria o autoconhecimento e a capacidade de não atribuir os próprios erros e fraqueza aos outros.
Uma outra importante característica de equilíbrio e saúde mental seria a “percepção realista do ambiente”. Uma visão realista do mundo, do ambiente e das pessoas é essencial para que se possa avaliar a melhor conduta em determinada situação. Conforme Feist e col., pessoas realistas “não vivem em um mundo de fantasia ou torcem a realidade para que se encaixe em seus próprios desejos”.
Um quinto aspecto de uma vida saudável seria a “capacidade de insight e humor”. Insight seria a capacidade de compreensão daquilo que é próprio, não próprio e comum ao ambiente. Envolveria capacidade de autoaceitação, visão realista do ambiente, capacidade de descobrir, pensar e entender elementos novos em si mesmo e nos outros. Por sua vez, capacidade de humor seria a capacidade de expressar de forma positiva e otimista ideias, sentimentos e até mesmo sentimentos ruins de tristeza ou indignação.
Allport discorreu sobre disposições motivacionais e estilísticas. Características motivacionais seriam intensamente experimentadas e as estilísticas teriam menor força e guiariam as ações, ao contrário das motivacionais que iniciariam as ações. Acreditava igualmente este pesquisador que a maioria das pessoas é motivada por impulsos presentes e não por eventos do passado, estando consciente do que faz e tendo alguma compreensão dos motivos de suas ações.
A proposta de Allport seria a valorização de estudos e métodos de pesquisa para o conhecimento da psicologia individual, ao contrário da tendência geral do estudo de psicologia no sentido de lidar com leis universais e válidas para o humano em geral.
Dr. Francisco Ruiz – Psiquiatra CRM 55945 RQE 33048